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SABIA QUE… O CAFÉ RIALTO FICOU FAMOSO MAS TEVE VIDA CURTA?

SABIA QUE… O CAFÉ RIALTO FICOU FAMOSO MAS TEVE VIDA CURTA?

Revisitamos algumas edições de O TRIPEIRO dos últimos anos, a centenária revista da Associação Comercial do Porto que é guardiã da história e do património da cidade desde 1908. Neste caso, espreitamos a edição de SETEMBRO 2015.

Pode adquirir as edições mensais da revista O TRIPEIRO nos serviços do Palácio da Bolsa através dos contactos disponíveis na página de Facebook da Associação Comercial do Porto.

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 Breve radiografia de alguns cafés do Porto

 

A vida curta do café Rialto

 Inaugurado nos primeiros dias de Dezembro de 1944 e localizado na Praça de D. João I, na esquina com a Rua Sá da Bandeira, o Café Rialto teve uma vida curta, não chegando a completar três décadas de existência. Fechou portas em 1972 para dar lugar a uma agência bancária. Era aqui que se reuniam os poetas do grupo “Notícias do Bloqueio” – Egito Gonçalves, Daniel Filipe, Papiniano Carlos, Luís Veiga Leitão, Ernâni Melo Viana, António Rebordão Navarro e José Augusto Seabra – autores dos nove fascículos de poesia que publicaram. Trata-se de mais um capítulo do trabalho sobre os cafés do Porto elaborado por duas doutorandas da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, Catarina Gonçalves e Daniela Ribeiro, que temos vindo a dar à estampa nas páginas de O TRIPEIRO.

  

CAFÉ RIALTO, Praça D. João I, na esquina com a Rua Sá da Bandeira

 

FUNDAÇÃO E ENCERRAMENTO

Inaugurado nos primeiros dias de Dezembro de 1944. Vinte e oito anos depois, encerra em 1972 para dar lugar a uma agência bancária.

 

AUTORIA

Edifício de Rogério de Azevedo; interior de Artur Andrade

 

FREQUENTADORES

Era frequentado por arquitetos, escritores, jornalistas e poetas.

 

IMPLANTAÇÃO

Inicialmente estava previsto que o café ocupasse o rés-do-chão do edifício com o café propriamente dito, estando a cave destinada a sala de bilhares. No entanto, o arquiteto optou por criar um “mezzanine” no rés-do-chão ficando o espaço do café a funcionar nos dois pisos, ligados entre si por uma imponente escadaria em mármore.

A ideia inicial de criar dois espaços fechados e distintos foi então substituída por um espaço contínuo, salvaguardando-se o espírito de unidade que se pretendia conferir ao café. De uma sala encerrada e sombria, o espaço da cave transformou-se numa luminosa e arejada sala de convívio.

 

ÁREA

A área total do café correspondia a cerca de 365 m2, sendo que a galeria do rés-do-chão ocupava cerca de 140 m2, e a cave 225 m2.

 

RELAÇÃO COM O EXTERIOR

Sendo um lote de esquina, beneficiava de uma relação direta quer com a Praça D. João I, quer com a Rua de Sá da Bandeira. A própria configuração dos arruamentos possibilitou a existência de uma esplanada voltada para a praça. Resguardada pela galeria do rés-do-chão, a esplanada funcionava como uma extensão do café para o espaço público, convidando à entrada no mesmo. A sua localização estratégica tornou-o um dos mais concorridos cafés do Porto, acabando por ditar também o seu encerramento.

 

FACHADA

O edifício em que se insere, da autoria de Rogério de Azevedo, é uma construção de linguagem modernista. Era considerado o “arranha-céus do Porto”, pela altura então pouco usual. O café não destoava desta linguagem, estando a sua fachada integrada no resto do edifício, conferindo ao todo uma unidade de linguagem.

Outro elemento de destaque, que identificava o café, era o grande letreiro “manuscrito” existente no gaveto, onde se lia “Rialto”.

 

INTERIOR

Concebido à imagem de seriedade e austeridade de um “espaço destinado à reunião de homens para a discussão de assuntos sérios”, todos os pormenores foram minuciosamente considerados pelo arquiteto, dando origem a um espaço majestoso, com uma decoração que primava pelo exaltamento de artistas nacionais e pela utilização de materiais nobres.

Revestido a mármores escuros de carácter imponente, possuía inúmeros baixos-relevos de cerâmica policromada, pinturas a fresco, e um mobiliário condizente com as luxuosas instalações. Inovadores jogos de luz foram igualmente integrados no desenho do espaço de forma a valorizar as próprias obras de arte. Aqui, a conjugação da luz natural com a colocação de espelhos, confere ao espaço um ambiente alegre e acolhedor.

Comum aos dois salões, o teto, com um enorme painel de espelhos, refletia a sala de baixo, criando uma sensação de amplitude. Várias paredes eram também elas revestidas com espelhos, que refletiam os frescos da autoria de Dordio Gomes e de Guilherme Camarinha. Junto à escadaria existiu um baixo-relevo do escultor João Fragoso e, no rés-do-chão, um enorme desenho a carvão da autoria de Abel Salazar ocupava uma das paredes, feito diretamente sobre ela.

À imagem da modernidade que foi atribuída ao espaço do café, o Rialto apresentava já equipamentos inovadores e ainda pouco usuais nos estabelecimentos comerciais do país. O café, com ar condicionado, possuía uma cozinha já completamente eletrificada e uma aparelhagem para a esterilização de chávenas, bem como um balcão frigorífico em cada um dos salões, e também um elevador.

 

NOTA DO EDITOR

Segundo a dissertação de Mestrado em História da Arte Portuguesa “Cafés Históricos do Porto: na demanda de um património ignoto”, de Nuno Fernando Ferreira Mendes, era no Café Rialto que se reunia o grupo dos poetas do “Notícias do Bloqueio” para redigirem os nove fascículos de poesia que publicaram. Na altura em que o café encerrou, a instituição bancária que lá se instalou preservou o mural de Abel Salazar, que ainda lá existe, mas destruiu os frescos e o baixo-relevo de Dordio Gomes, Guilherme Camarinha e António Duarte. Este café foi frequentado por inúmeros intelectuais da época. Mas os mais célebres frequentadores deste estabelecimento foram, certamente, o grupo dos poetas do “Notícias do Bloqueio”: Egito Gonçalves, Daniel Filipe, Papiniano Carlos, Luís Veiga Leitão, Ernâni Melo Viana, António Rebordão Navarro e José Augusto Seabra.

 

Texto de Catarina Gonçalves e Daniela Ribeiro, doutorandas da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto