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SABIA QUE… O CAFÉ CEUTA FOI MANDADO CONSTRUIR EM 1953?
SABIA QUE… O CAFÉ CEUTA FOI MANDADO CONSTRUIR EM 1953?
Revisitamos algumas edições de O TRIPEIRO dos últimos anos, a centenária revista da Associação Comercial do Porto que é guardiã da história e do património da cidade desde 1908. Neste caso, espreitamos a edição de OUTUBRO 2015.
Pode adquirir as edições mensais da revista O TRIPEIRO nos serviços do Palácio da Bolsa através dos contactos disponíveis na página de Facebook da Associação Comercial do Porto.
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Breve radiografia de alguns cafés do Porto
Café Ceuta, um resistente dos anos 50
Em 2014, as páginas de O TRIPEIRO abriram-se a um trabalho sobre os cafés do Porto elaborado por duas doutorandas da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, Catarina Gonçalves e Daniela Ribeiro. Na sequência desses textos, estivemos ao longo deste ano a conhecer as fichas técnicas mais detalhadas de alguns desses cafés, incluindo fotografias, plantas, alçados e detalhes diversos sobre aspetos de caráter histórico e arquitetónico. Este mês concluímos esta longa série de publicações com referência ao Café Ceuta, estabelecimento de meados do século passado consagrado, tal como o nome indica, à saga portuguesa de há 600 anos.
CAFÉ CEUTA, Rua de Ceuta, 20/26
FUNDAÇÃO
Fundado a 18 de Julho de 1953. Ainda se encontra em funcionamento.
AUTORIA
Edifício de Carlos Neves
FREQUENTADORES
Era conhecido pelas tertúlias que ali decorriam. A cave, com a sua enorme sala de bilhares, era local popular para a prática de “snooker”. Frequentado por literatos, jornalistas, escritores e atores.
IMPLANTAÇÃO
Ocupa quase todo o rés-do-chão do edifício em que se insere, à exceção da área que garante o acesso aos pisos superiores, assim como, ao nível da cave, toda a área de implantação do edifício. O café conta ainda com um corpo a norte, que se desenvolve apenas ao nível do rés-do-chão e onde se insere a copa destinada à preparação de refeições. O logradouro do prédio, na cave, é acessível apenas através do café.
Todo o edifício obedece a uma modulação rígida, incluindo a área do café, onde a própria estrutura determina a organização do espaço.
Existem duas entradas ao nível do rés-do-chão, apesar de apenas uma ser atualmente utilizada. A entrada que se encontra encerrada dá acesso direto às escadas que conduzem à cave.
ÁREA
A área total do café corresponde a cerca de 545 m2, distribuindo-se pelo rés-do-chão, cave e zona de copa. No rés-do-chão, o salão de café propriamente dito ocupa cerca de 185 m2. Na cave, localizavam-se os bilhares, as instalações sanitárias e os arrumos, num espaço de cerca de 245 m2.
RELAÇÃO COM O EXTERIOR
Apesar de se tratar de um lote com uma frente de rua bastante larga, o café não possui esplanada. O declive acentuado da rua e o seu carácter de passagem, impedem a apropriação da mesma enquanto espaço de estar.
Toda a frente de rua é envidraçada, não obstante trata-se de um espaço muito voltado para o interior. A cave (atualmente quase sempre imersa na penumbra) acentua este sentido de interioridade.
FACHADA
O edifício em que se insere é uma construção de linguagem modernista. A fachada, ritmada e geométrica, é feita em betão e caracteriza-se por um harmonioso jogo de luz e sombra conseguido através de avanços e recuos de volumes. Tal sistema é aplicado, por exemplo, através da retícula que define as varandas dos pisos superiores ou até mesmo na caixa que demarca a montra do café. Também os principais acessos, quer ao edifício, quer ao café em si, são assinalados através do recuo dos vãos.
A fachada do café propriamente dita constitui o embasamento do edifício e é revestida a granito polido escuro. Outro elemento de destaque, que identifica o café, é o grande letreiro “manuscrito” onde se lê “Café Ceuta”.
INTERIOR
O café é de planta retangular, desenvolvendo-se no sentido transversal à fachada. A sala é colmatada com o balcão ao fundo, que inicialmente fazia a transição entre a sala do café e a copa.
Atualmente o balcão mantém-se ainda em frente à entrada, contudo apresenta uma linguagem totalmente distinta – é agora um balcão metálico, adaptado à função de snack-bar – e com uma dimensão substancialmente maior.
O pavimento em marmorite com juntas metálicas e os lambris forrados a mármore, onde assentam os espelhos de cristal, mantiveram-se. Debaixo destes, os sofás em napa vermelha, também. Todo o espaço é ocupado por mesas, refletidas nos enormes espelhos que cobrem as paredes, encimados por painéis decorativos, alusivos aos Descobrimentos, por trás dos quais se esconde o friso inicial de pinturas a fresco da autoria de Coelho de Figueiredo.
De uma forma geral a decoração interior mantém-se relativamente fiel à decoração original, sendo que mesmo a zona de bilhares continua a ser utilizada como tal.
NOTA DO EDITOR
Neste café mandado construir por Ferreira dos Santos em 1953 e da autoria do arquiteto Carlos Neves, a decoração é totalmente alusiva à conquista de Ceuta. Trata-se de um dos poucos cafés dos anos 50 do século passado que ainda se encontra em funcionamento. Era frequentado por personalidades como Sottomayor Cardia, figura histórica do PS e antigo ministro da Educação, Montalvão Machado ou Eurico de Melo, nomes de referência da história do PSD, e alguns membros da família Sá Carneiro, a que não será estranha a proximidade da casa da família na Rua da Picaria.
Texto de Catarina Gonçalves e Daniela Ribeiro, doutorandas da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto