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Sérgio Sousa Pinto: “Os dilemas nacionais ultrapassam em muito a dimensão do PS ou do PSD”
Convidado de honra do jantar de sócios da Associação Comercial do Porto, Sérgio Sousa Pinto mostrou-se igual a si próprio, optando por responder às questões colocadas pela assistência, em detrimento do discurso escrito. A degradação do regime político, as reformas necessárias ao país e o papel do Estado na sociedade foram alguns dos temas que dominaram as intervenções do deputado do Partido Socialista.
A primeira questão colocada ao orador centrou-se na perceção, cada vez mais presente na sociedade, de uma perda de qualidade dos membros eleitos para a Assembleia da República. Embora reconhecendo a “trajetória descendente” que se verifica nas listas de deputados, Sousa Pinto considerou que o Parlamento “é apenas um sintoma da degradação do regime” e o fator “mais visível” do que considerou ser o crescente “desprestígio das pessoas que decidem dedicar a vida à causa pública”. “Quantos de nós gostaríamos de ver, hoje em dia, os nossos filhos seguirem uma carreira política?”, confrontou o antigo eurodeputado, assumindo que “não é só a violência do escrutínio, a demagogia das remunerações dos políticos ou o discurso contra os privilégios” que contribui para o estado de degradação a que chegou a imagem da classe dirigente. É, na sua perspetiva, “a desqualificação da função”, que numa comunicação social cria a imagem de que “vai para político quem não reúne qualidades compatíveis com o êxito da vida privada”. “Numa época que idolatra o dinheiro, as funções públicas parecem uma espécie de campeonato de segunda linha, não para os primeiros e segundos melhores, mas só para os terceiros ou quartos”, aprofundou o convidado, que não deixou também de apontar erros à estratégia dos partidos, cujo sistema de incentivos vai “no sentido de excluir os melhores”, dá “tréguas à incompetência” e “premeia o servilismo”.
Noutra questão, Sérgio Sousa Pinto foi confrontado com as responsabilidades governativas do seu partido, nas últimas décadas, e o peso que esse histórico tem no estado do país. O deputado do PS reiterou ser socialista do ponto de vista ideológico, embora não tenha escondido a frustração por ver “muitas vezes” o seu partido “ser mais parte do problema do que da solução”. Ainda assim, exortou os presentes a saírem da “caixa partidária”, considerando que os “dilemas nacionais ultrapassam em muito a dimensão do PS ou do PSD” e afirmando que a “obsolescência” do país tem menos a ver com as diferenças entre esquerda ou direita e mais com a divisão entre “resignados e não resignados”.
“Temos um problema com o Estado em Portugal”
Apontando o “desempenho deprimente” da economia nacional nos últimos 20 anos, e reiterando não acreditar no “nirvana liberal”, o socialista admitiu que um dos caminhos a fazer para retomar a rota do crescimento é resolver “o problema que temos com o Estado” e assumir que “os impostos em Portugal são demasiado elevados e esmagam a liberdade das empresas e das famílias”. Não sendo um liberal, eu tenho de fazer um comum com os liberais. Hei-de fazer com quem? Com os estatistas?”, questionou.
A reforma do sistema de justiça foi outro dos temas com que o convidado foi confrontado. Sérgio Sousa Pinto apontou a “indispensável separação de poderes” e “independência do Ministério Público”, mas não deixou de se interrogar sobre a recente operação de que foi alvo um “grande partido democrático” pelo que considerou uma “razão quase fútil”. “É a velha questão da ciência política: quem guarda os guardas”, salientou, defendendo um modelo equilibrado, em que os poderes “cumprem a sua função tal como é desenhada na Constituição”. “As pessoas íntegras têm direito a uma vida moral e não serem sujeitas a humilhação”, acrescentou, lembrando que, a não ser assim, “quem é que se vai sujeitar à vida pública?”.
O antigo líder da Juventude Socialista e comentador político, confrontado com a ausência de reformas no país, considerou que a sociedade portuguesa torna as mudanças “muito difíceis” e que a reação dos grupos de interesses mostra que “não se consegue fazer nada”. Ainda assim, Sérgio Sousa Pinto concordou com o “défice reformista”, mas deixou a convicção de que “o país não vai mudar com nenhum grande projeto, mas sim com os pequenos projetos”. “E os pequenos projetos não são o Estado e os fundos europeus. São os vossos projetos e a possibilidade de trabalhar e ganhar; de ganhar e poupar; de poupar e investir. É assim que o país muda, não há outra maneira”, concluiu.
Veja, na íntegra, a intervenção de Sérgio Sousa Pinto
21 de julho 2027