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Felisbela Lopes: “não temos, hoje, uma informação mais descentralizada. Pelo contrário!”
O tema escolhido por Felisbela Lopes prometia refletir o peso dos territórios e dos temas regionais nos media. E a professora de Ciências da Comunicação, conhecida analista de imprensa, foi clara na avaliação que fez sobre o assunto: a localização dos meios de comunicação social “conta muito” para as agendas noticiosas e, apesar do maior acesso às notícias ser mais alargado, os tempos que vivemos não apresentam uma tendência para a descentralização. “Pelo contrário”, afirmou, dizendo mesmo que “quem está fora de Lisboa, fica afastado da palavra mediática”.
A antiga pró-reitora da Universidade do Minho começou por fazer um enquadramento rápido do fenómeno mediático, explicando à audiência que os meios de comunicação funcionam por “ondas noticiosas”, que normalmente “não coabitam”. Exemplo? O surto de legionella, em 2014, que acabou por ser excluído da agenda em dois momentos, primeiro devido a uma investigação sobre vistos gold; mais tarde devido à detenção do antigo primeiro-ministro, José Sócrates. Nesta “estrutura circular da informação”, há dois factores que, na perspetiva da convidada, influenciam cada vez mais a agenda: as redes sociais e a pressão das fontes. Neste particular, Felisbela Lopes, considerou que os media criam uma espécie de “confraria da agenda”, que obriga as fontes a “estarem sempre disponíveis e a falar sobre tudo”. “Quando fiz parte da equipa reitoral [da Universidade do Minho] defendia que não temos de estar sempre a comunicar. Não temos de estar sempre a falar”, exemplificou.
RTP Porto “não é dado adquirido”
Depois de refletir sobre a “crono-mentalidade dos jornalistas”, que exigem às fontes a capacidade de “falarem do que é essencial” em pouco tempo, a oradora centrou-se no tema principal da intervenção e afirmou que os media também definem uma agenda com base na geografia. Recorrendo ao estudo que está a realizar sobre notícias de saúde entre 2010 e 2020, Felisbela Lopes considerou que “o lugar onde as notícias são produzidas conta muito”, não tanto ao nível da tematização – aspeto onde “não é muito diferente estar ou não em Lisboa” –, mas sobretudo na escolha dos protagonistas: “usam-se as fontes mais próximas para a contextualização”.
Esta realidade, apontou, “é pior na televisão”, tendo a analista feito uma advertência sobre o Centro de Produção do Porto da RTP, cuja subsistência, na sua opinião, “não é um dado adquirido”. Felisbela Lopes afirmou mesmo que não temos hoje “uma informação mais centralizada, pelo contrário”, recordando ter “sensibilizado muitos colegas para a importância da descentralização”, quando assumiu a coordenação do livro branco sobre o serviço público de rádio e televisão. “Um serviço que é pago por todos nós deve estar deslocalizado, deve ir ao encontrar dos cidadãos”, defendeu.
Como causas para esta falta de coesão territorial nos media, Felisbela Lopes apontou para o frágil desenvolvimento da imprensa regional – ao contrário do que acontece em França ou Espanha – mas apontou também o medo às instituições, usando a Academia como um exemplo: “as universidades têm de criar agendas mais atrativas para o espaço mediático”. A convidada considerou ainda que não é possível “pensar num processo de descentralização ou de regionalização sem pensar nos media”, uma vez que também se trata de “lutar contra as assimetrias”.
19 de junho 2023