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Entrevista de Nuno Botelho ao JN no arranque de mais um mandato à frente da Associação Comercial do Porto
“Quem está em Lisboa tem muita dificuldade em ouvir” – Entrevista a Nuno Botelho
Nuno Botelho Presidente da Associação Comercial do Porto critica centralismo, diz que Linha Rosa do metro é prémio de consolação e exige investimento no aeroporto e em Leixões
Por
Carla Soares, carlas@jn.pt
19 de Julho de 2018
No arranque de mais um mandato à frente da Associação Comercial do Porto (ACP), Nuno Botelho, de 44 anos, lamenta que Portugal seja “fortemente centralizado” e que os seus contributos para a gestão da rede rodoviária não tenham resposta. A propósito da descentralização, defende a extinção da Associação Nacional de Municípios Portugueses e promete para setembro outro estudo, desta vez sobre os serviços públicos. Quanto ao metro, diz que a Linha Rosa é “um prémio de consolação”. Já questionado sobre a hipótese de ser candidato à Câmara do Porto, diz que fará sempre parte da solução que Rui Moreira encontrar.
Afirmar a Associação Comercial do Porto e a cidade é uma das prioridades do seu novo mandato, organizando eventos como a conferência sobre o clima com a vinda de Barack Obama?
É claramente. Ao fim de mais de cinco anos à frente da associação, cumprimos três objetivos fundamentais: rejuvenescimento, abertura à comunidade e trabalho em rede com outras instituições. Para além destes três pilares, queremos cimentar a posição de interlocutor junto da rede empresarial, mas também como agregador dessas empresas e dos empresários, como fator de reivindicação e de defesa dos interesses da cidade e da região junto do poder central. A conferência das alterações climáticas foi um momento absolutamente único para o Porto e para a região porque foi muito agregador.
Nesse papel de interlocutor, que reivindicações continuam sem resposta do Governo?
A descentralização de competências está na ordem do dia. Recentemente, elaboramos um estudo sobre a gestão da rede rodoviária e agora estamos a fazer outro para apresentar em setembro sobre descentralização de serviços públicos. Vamos mostrar que, do ponto de vista da eficiência económica, é possível descentralizar e poupar desde que essa descentralização seja acompanhada do respetivo envelope. Não é como o Governo está a querer fazer. Essa questão esteve em cima da mesa, relativamente à Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP). E penso que nem deveria ser a ANMP a negociar em bloco porque há especificidades de diferentes municípios. Cabe ao Governo ter a paciência de negociar com cada um. Desse ponto de vista, sou favorável à extinção da ANMP.
Não passa hoje de uma instituição anacrónica e burocrática.
Deve ser substituída nesse processo por outro interlocutor?
Poderíamos ter as CCDR, as áreas metropolitanas ou mesmo as CIM. Não faltam interlocutores para, se calhar de forma mais ágil, tratar do assunto.
O que nos pode adiantar do estudo sobre os serviços públicos?
Vai tornar muito evidente que há vantagens para o país. É um estudo sério pedido por nós que está a ser feito por investigadores da Universidade do Minho e pessoas ligadas às universidades do Porto e de Lisboa. Um contributo que será entregue ao Governo.
A relação com a Câmara do Porto é a melhor possível?
A relação é ótima. Estive desde a primeira hora envolvido na candidatura de Rui Moreira e fui diretor da primeira campanha. O projeto de uma cidade livre e independente, popular mas cosmopolita, de boas contas, olhando para a economia como essencial para o crescimento da cidade e com preocupação social pelos mais pobres, continua presente e de boa saúde. E a associação é também ela uma instituição que vive de forma absolutamente livre e independente de poderes públicos, com o seu orçamento e boas contas.
Quer seguir os passos do seu antecessor na ACP? Admite candidatar-se à Câmara do Porto?
Rui Moreira está há um ano no segundo mandato. Ainda não é um assunto que preocupe as pessoas.
O meu serviço em prol da cidade e da região tem sido à frente da associação e é assim que me vejo hoje.
Mas admite ou não disputar a Autarquia no pós-Moreira?
Rui Moreira é um excelente presidente, não sei se vai continuar ou não. Saberá encontrar a solução de continuidade que entenda mais conveniente. Estarei sempre na solução que Rui Moreira encontrar para governar a cidade.
O turismo gera forte polémica. O que defende neste setor?
Há muito para discutir no turismo. Podemos sempre melhorar e fazer mais. Mas é um fator essencial. A cidade está hoje melhor do que estava há cinco anos, isso ninguém pode negar. Tem investimento estrangeiro como nunca, tem o parque habitacional reabilitado como não tinha há muitos anos, tem pujança do ponto de vista turístico e da atração de novos negócios. A comunidade estrangeira está a aumentar e isso é positivo. Temos de discutir, por exemplo, se devemos manter abertas todas as vias de trânsito. A Câmara está a estudar o assunto.
Devemos repensar o trânsito, sobretudo na zona histórica. E, fundamentalmente, a questão dos autocarros turísticos. Contra mim falo porque a ACP beneficia muito da chegada desses autocarros.
É preciso restringir a circulação desses autocarros?
Eventualmente. É uma questão que merece estudo e ponderação.
Teve algum eco do vosso estudo sobre as portagens e a VCI?
Não porque vivemos num país fortemente centralizado, apesar de termos enviado o estudo para a Infraestruturas de Portugal, para o ministro, o primeiro-ministro e o presidente da República. Quem está em Lisboa tem muita dificuldade em ouvir porque é uma maçada e isto é complicado, mas água mole em pedra dura tanto bate até que fura. Não vamos desistir deste combate. Sou muito favorável a que o atravessamento da VCI por veículos pesados seja portajado.
Não faz sentido este corredor urbano ser todos os dias massacrado de trânsito quando poderia ser desviado pela Circular Regional Exterior do Porto (CREP), cujas portagens seriam suavizadas.
Regionalizar ainda faz sentido?
Neste momento é difícil. Já ficava contente se houvesse uma descentralização efetiva, mas continuarei a defender regionalização.
Concorda com o que está previsto para o metro na Invicta?
Temos defendido há muito junto do Governo a Linha do Campo Alegre. Deveria ter sido implementada. É absolutamente crucial.
Apoia a nova Linha Rosa?
Concordo porque sou sempre favorável ao investimento. Agora, é evidente que não passa de um prémio de consolação. Se houver vontade política, os fundos aparecem.
É preciso que o Governo, juntamente com as autarquias, faça pressão politica para os obter.
E a taxa turística foi uma boa solução para o Porto?
Sou absolutamente favorável.
Dentro de um ano veremos de forma clara os benefícios e o modo como a cidade ficará melhor gerida com a aplicação desses fundos.
Qual tem sido o feedback?
É positivo. Os hoteleiros e a restauração estão satisfeitos. E as pessoas reconhecem a necessidade da taxa. O turismo tem sido a alavanca económica da cidade e da região. Sou frontalmente contra tentarmos matar a galinha dos ovos de ouro. É evidente que nem tudo são rosas. Temos de olhar, por exemplo, para a necessidade imperiosa de melhorar a formação dos quadros na área da hotelaria, da restauração, dos intérpretes e guias. E, como disse, temos de regular o trânsito de forma diferente. Como em tudo na vida, às vezes há dores de crescimento mas temos de manter a serenidade.
Então e os moradores do Centro Histórico que são expulsos devido ao alojamento turístico?
Não é por decreto que vamos limitar. O mercado vai encarregar-se de regular isso. Há muito para reabilitar. Há outras zonas que começam a despontar. Pode haver um excesso ou outro, mas temos de ver isto de forma global. E a Câmara anunciou que aplicará parte da taxa turística em realojamento.
O aeroporto Francisco Sá Carneiro tem que crescer mais?
Iremos fazer chegar ao Governo as nossas preocupações. O de Lisboa está com enormes dificuldades porque foi adiando a extensão ao Montijo. A meu ver, os seus problemas são mais de arrumação e de falta de dono. No Porto, há diretor e o aeroporto funciona bem. Mas, a breve prazo, pode vir a ter os mesmos problemas. É altura do Governo pressionar a ANA a implementar medidas para que as coisas corram melhor. Estamos a falar do aumento de pistas, da forma como o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras atua e das greves dos diversos operadores. Temos que olhar para o aeroporto com carinho e cuidado. O mesmo se passa com o Porto de Leixões.
É urgente investir em Leixões?
O Governo anda há anos a anunciar obras que nunca mais arrancam. Temos cada vez mais constrangimentos porque está no limite da sua capacidade, em pré-rutura. No porto de Leixões, que teve sempre uma enorme paz social, vejo com preocupação que os sindicatos afetos à extrema esquerda estejam a tomar conta daquilo e a querer criar complicações.