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Conversas na Bolsa: Mendonça e Moura não diz que “o mundo está perdido”, mas compreende “a revolta” dos agricultores
Não podia ter havido contexto mais apropriado para a presença de Álvaro Mendonça e Moura, na edição inaugural do novo ciclo das Conversas na Bolsa 2024. Em plena contestação do setor agrícola, o presidente da CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal foi à origem dos protestos e enquadrou o momento difícil que atravessa a produção nacional.
Antes de chegar à atualidade, o antigo embaixador português procurou enquadrar os motivos que conduzem a sociedade atual ao “desânimo” e à sensação “de que o mundo está perdido”. Na perspetiva de Mendonça e Moura, a ideia de que “tudo tem de levar uma volta” decorre do facto de “as mudanças estarem a acontecer de uma forma vertiginosa” e a sociedade, em geral, “não conseguir acompanhar”. “O Estado perdeu o controlo de muitas situações, como a moeda, as fronteiras ou a informação, e concluímos que o homem não consegue responder a tudo”, observou o convidado, assumindo que estamos perante “um processo de transformação radical da forma como olhamos o mundo” e que isso “acaba, inevitavelmente, em revolta”. “Achamos que a culpa é sempre do outro, estamos a protestar uns contra os outros”, acrescentou.
Esta tensão instalada, na perspetiva do presidente da CAP, é o que está a levar os agricultores aos protestos e ao facto de “todos os países reclamarem coisas diferentes”, dando exemplos das reivindicações que estão a ocorrer em França, Itália e até na Ucrânia. Sobre o caso português, o dirigente considerou que o episódio que “fez transbordar o copo” foi o corte de 35% das verbas programadas para serem atribuídas em 2024. Uma “estupidez”, assinalou Mendonça e Moura, que justifica “o sentimento de revolta” de uma classe profissional que, na sua opinião, tem conseguido grandes progressos nas últimas décadas: “passamos de uma taxa de cobertura das importações de produtos alimentares de 11 para 41%; fizemos um extraordinário progresso da empresarialização do setor; temos hoje as frutas, legumes e flores a valerem quatro mil milhões de euros por ano”, exemplificou o convidado.
Agricultura é alvo de “desconsideração social”
Apesar desta evolução, Mendonça e Moura não deixou de explicar os restantes motivos, além do último corte nos apoios decretado pelo Governo, que levaram os agricultores nacionais para a rua. Na perspetiva do antigo diplomata, existe uma “desconsideração social” pela atividade, extensível a todo o continente europeu, que tem hoje menos 37% de produtores do que existia nos anos 90. “As pessoas não retiram rendimento suficiente”, alegou, lembrando que “o salário médio na agricultura é metade daquele que se verifica noutros setores”.
Reportando aos parâmetros do Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC), o convidado sublinhou a “liderança global” que a Europa conquistou ao nível da segurança alimentar, mas lembrou que, em quase todos os restantes pontos, o PEPAC falhou. “Não estamos a melhorar a posição da agricultura na cadeia alimentar, não existe renovação geracional, a dinamização das zonas rurais falhou e o rendimento justo não está a ser conseguido”, enunciou o líder da CAP. “Sem autonomia alimentar, não vamos ter autonomia estratégia na Europa”, recordou o convidado, considerando que este objetivo “está a ser colocado em causa devido aos excessos da regulamentação ambiental”. “A política externa tem de ter em consideração a competitividade”, concluiu.
15 de fevereiro 2024