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Clarificação política, menos intervencionismo e melhor gestão de recursos no 4º debate do Ciclo Projetor2030, sobre a reforma do Estado
O Estado esteve em debate na quarta conferência PROJETOR 2030, realizada a 14 de novembro, pela Associação Comercial do Porto. A questão “Temos ou não Estado a mais?” foi colocada à ex-deputada do CDS-PP, Cecília Meireles; ao vice-presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), Rafael Campos Pereira e ao deputado e ex-líder da Iniciativa Liberal, Carlos Guimarães Pinto.
CECÍLIA MEIRELES: “SE QUEREMOS UM ESTADO MAIS ÁGIL, ENTÃO NÃO PODE SER SOLUÇÃO PARA TUDO”
Numa sessão moderada por Gonçalo Lobo Xavier, Diretor da Associação Comercial do Porto, a visão ideológica sobre o papel do Estado na sociedade começou por ser a nota dominante da intervenção de Cecília Meireles. A advogada defendeu um “discurso mais claro” e uma maior “exigência” sobre esta matéria, para evitar a contradição de, por um lado, se defender que “há Estado a mais” e depois, “sempre que há um problema”, pedir uma intervenção pública. “Se queremos um Estado mais ágil e pagar menos impostos, então temos de perceber que o Estado não pode acorrer a tudo e não pode ser a solução para todos os problemas. Temos de o dizer com essa clareza”, defendeu.
Cecília Meireles acrescentou uma segunda clarificação, quando se fala de diminuir o peso da intervenção estatal, alertando que “uma coisa é defender menos Estado e outra é defender um Estado forte onde ele tem de estar presente”, dando como exemplo a justiça e outras funções de soberania onde subsistem falhas. “Quando se está à espera de uma decisão judicial há 10 ou 15 anos, não temos um Estado que está presente onde é preciso”, alertou.
Por oposição, a convidada defendeu uma efetiva redução do peso do setor público em “setores onde deve ser privilegiado o bom serviço, e o serviço a preços mais competitivos”, citando a saúde como exemplo.
Veja a intervenção de Cecília Meireles
RAFAEL CAMPOS PEREIRA: “CHEGAMOS AO ABSURDO DE SER O ESTADO CENTRAL A DETERMINAR QUAIS SÃO AS PROFISSÕES QUE PRECISAMOS”
“Centralista, paternalista, dirigista, intervencionista e assistencialista”. Foi com cinco adjetivos que Rafael Campos Pereira, vice-presidente da CIP, caracterizou o que referiu ser um Estado de “péssima qualidade”, mais do que ser grande ou pequeno.
Sobre o centralismo, o jurista assinalou “a concentração desmesurada de poder em Lisboa”, com organismos que se “autoalimentam”, sem dar resposta às populações. Rafael Campos Pereira considerou, por outro lado, que o paternalismo é o que “distingue as sociedades evoluídas das mais atrasadas e retrógradas”, na medida em que aquelas são capazes de promover uma maior autorregulação entre os setores, evitando a presença excessiva do Estado. “Em Portugal, não somos capazes de dar o protagonismo devido aos empregadores, aos trabalhadores e aos seus representantes, que são aqueles que conhecem melhor as empresas e que estão mais identificados com as necessidades”, enquadrou, usando a concertação social como exemplo deste obstáculo. Na perspetiva de Rafael Campos Pereira, esta situação conduz a uma “sucessão de normas imperativas”, nomeadamente ao nível laboral, que reforça paternalismo público em matérias como a organização do trabalho.
A política de formação e qualificação foi o exemplo que o convidado referiu para apodar o Estado de “dirigista”, na medida em que, na sua perspetiva, “chegamos ao absurdo de ser o Estado central a querer determinar quais são as profissões de que precisamos e quais são as ações de formação que devem ser feitas”, prejudicando a dinâmica do mercado de trabalho.
Evitando falar de “nacionalizações”, dos “abusos com a Covid” e das “empresas do regime”, o também Vice-Presidente Executivo da AIMMAP voltou a mencionar a legislação laboral como uma referência em matéria de intervencionismo público. Rafael Campos Pereira considerou que o Estado “não resiste a interferir sistematicamente na legislação laboral” e recordou que esta prática já é anterior à democracia, quando o Estado Novo colocava os tribunais do trabalho na esfera do Ministérios das Corporações e não no Ministério da Justiça.
Finalmente, Campos Pereira considerou o governo estatal assistencialista, dando como exemplo os recentes vouchers criados para mitigar a subida do preço dos combustíveis. O orador disse mesmo que, por culpa do assistencialismo, temos um Estado que “cobra impostos a mais” para os “devolver depois”, numa estratégia cujo objetivo “é não criar riqueza, mas gerir a pobreza”.
Veja a intervenção de Rafael Campos Pereira
CARLOS GUIMARÃES PINTO: “NÃO SÓ O ESTADO GERE MAIS RECURSOS DO QUE SERIA ESPERADO, COMO A FORMA COMO OS USA É BASTANTE ESTATISTA”
O deputado da Iniciativa Liberal (IL), Carlos Guimarães Pinto, enquadrou a sua apresentação em três níveis: os recursos que o Estado gere; a forma como os gere e a forma como condiciona todos os recursos que não gere. O orador recordou que a administração pública tem, a seu cargo, cerca de 50% de todos os rendimentos gerados no país, e considerou que, apesar de haver outros países europeus onde são transferidos “muito mais recursos para o Estado do que no nosso”, a leitura deve ser feita em valores relativos: “não há muitos países com o nosso nível de desenvolvimento que tenham tantos recursos a serem geridos pelo Estado”. Isso, significa, na perspetiva do deputado, que o “esforço fiscal” feito pelos portugueses “é muito maior do que noutros países”.
O segundo problema desta equação, de acordo com Carlos Guimarães Pinto, está na forma como o Estado gere os recursos que são colocados à sua disposição. Usando a saúde como exemplo, o parlamentar lembrou que não tem de ser o Estado a acumular o papel de financiador e prestador dos serviços públicos. “Em grande parte dos países da Europa central, o Estado financia cuidados de saúde de grande qualidade – até de qualidade superior àqueles que temos – quem providencia esses serviços de saúde não é uma máquina estatal, mas sim entidades privadas que garantem liberdade de escolha às pessoas”, observou o deputado da IL, considerando que “não só o Estado gere mais recursos do que aquilo que seria esperado para a dimensão da economia, como a forma como usa esses recursos é bastante estatista”.
Finalmente, Carlos Guimarães sublinhou a interferência que o Estado tem na gestão dos recursos terceiros – das pessoas e das empresas. Caricaturando a burocracia da administração pública, o liberal considerou “inúteis” algumas obrigações e lamentou os atrasos nos processos de licenciamento que “impedem muitas empresas de investirem e criarem empregos”.
Veja a intervenção de Carlos Guimarães Pinto
18 de novembro de 2022