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3ª Sessão PROJETOR2030 – Criar atrito ao automóvel; repensar o território e introduzir tecnologia: conceitos chave para a mobilidade do futuro no Grande Porto













Mobilidade foi o tema que, no passado dia 26 de outubro, a Associação Comercial do Porto convocou para a terceira conferência projetor 2030, evento dedicado a refletir sobre a execução do próximo quadro comunitário. A sessão promoveu, em concreto, um debate sobre a política de transportes na Área Metropolitana do Porto (AMP) e o desejável caminho da sustentabilidade e cumprimento das metas de descarbonização.
Carlos Oliveira Cruz: “No Porto, temos um problema de repartição modal”
O primeiro orador convidado, Carlos de Oliveira Cruz, fez uma retrospetiva sobre as alterações demográficas que se verificaram na AMP nas últimas décadas, concluindo que a perda de população e de emprego na cidade do Porto não correspondeu a uma perda de centralidade em termos de movimentos. “O Porto continua a funcionar como rótula do sistema de transportes”, sublinhou o professor e investigador do Instituto Superior Técnico, acrescentando que a este problema de gestão da rede se soma um outro constrangimento, relativo à “repartição modal”. Isto é, à utilização dos diferentes modos de transporte, que tem vindo a deslocar-se progressivamente para o automóvel como meio preferencial: “em 2001, 34% das deslocações na AMP eram feitas em transportes públicos e, em 2017, esse número reduziu para 16%”. Os dados significam um retrocesso, na perspetiva do especialista, “num contexto em que discutimos a necessidade de descarbonizar a mobilidade”.
Ciente de que a pandemia veio “agravar muito este desequilíbrio”, Carlos de Oliveira Cruz chamou a atenção para a “deseconomia” que representam cerca de “300 milhões de horas perdidas em deslocações” no chamado Grande Porto, todos os anos, com perdas de produtividade na ordem dos três mil milhões de euros. Na perspetiva do académico, há três princípios a aplicar para uma mudança de paradigma: “dor, dinheiro e estratégia”. Na dor, o docente do IST defendeu um aumento do “atrito sobre o uso do automóvel individual”, o que significa, em termos práticos, menos estacionamento disponível nas cidades e custos de portagem mais elevados. Por dinheiro, Carlos de Oliveira Cruz defendeu maior investimento no sistema de transportes públicos, para captar mais utilizadores e recuperar os que foram perdidos na pandemia. Finalmente, em termos estratégicos, o convidado defendeu uma alteração da centralidade do Porto, porque “a cidade não é mais capaz de funcionar como rótula do sistema”.
Veja o vídeo da intervenção de Carlos Oliveira Cruz
Teresa Sá Marques: “é necessária uma grande mudança de comportamentos”
Teresa Sá Marques, professora da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (FLUP) e investigadora na área do planeamento urbano, analisou as diferenças que a região metropolitana do Porto apresenta face a Lisboa e que decorrem, no essencial, de um “sistema de concentração populacional policêntrico”, caracterizado por uma distribuição de atividades e serviços que atravessa o noroeste do país.
Este território mais “fragmentado”, apresenta o que considerou ser um “sistema de mobilidade complexo”, mas essencialmente “suportado no automóvel”, com enfoque em regiões de caráter mais industrial, como o Tâmega e Sousa. Na perspetiva da geógrafa, a mobilidade terá de ser pensada de acordo com estas escalas territoriais e reunindo “o máximo de informação possível para tomar boas decisões”. Teresa Sá Marques defendeu que o investimento público em matéria de transportes não pode ser “baseado apenas na oferta”, antes “compreender a diversidade da procura” e ajustar-se às necessidades das populações.
Defensora de políticas integradas, a professora da FLUP considerou que a transição para um sistema de mobilidade sustentável pressupõe, também, uma “grande mudança de comportamentos”. E esta só acontecerá com uma intervenção a montante: “não vamos mudar se não atuarmos nas escolas, na promoção de atitudes mais sustentáveis e promotoras de uma vida mais confortável e mais saudável”.
Veja o vídeo da intervenção de Teresa Sá Marques
Sandra Brito e Melo: “vamos disponibilizar serviços em tempo real”
Diretora do CEiiA e também professora da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (FEUP), Sandra Brito e Melo trouxe uma perspetiva tecnológica à conferência, identificando aquelas que considera ser as principais tendências de inovação para esta década, na área da mobilidade.
A investigadora começou por apontar a mobilidade partilhada como um conceito que irá proliferar nos próximos anos. “Deixamos de olhar para o veículo como uma propriedade para passar a ser um serviço”, sublinhou, dando como exemplo a possibilidade de as empresas terem frotas automóveis partilhadas, pensando numa lógica de eficiência de recursos e sustentabilidade. Sandra Melo deu como exemplo de mobilidade partilhada a plataforma AYR, desenvolvida pelo CEiiA, e que funciona na base da atribuição de créditos aos utilizadores de bicicletas comunitárias, para utilizarem em transportes públicos ou em compras.
A segunda grande tendência identificada pela convidada é o uso da inteligência artificial, de sensores e IOT na mobilidade. Reconhecendo que hoje é possível, através dos sinais dos telemóveis, “perceber como e para onde se movem as pessoas”, Sandra Melo antecipa que no futuro possam ser disponibilizados “em tempo quase real”, serviços de transporte para os utilizadores. De resto, a especialista deu o exemplo da Carris, que já está a testar este tipo de soluções em parceria com o CEiiA.
A mobilidade aérea é, de acordo com Sandra Melo, outra das grandes novidades tecnológicas que irá ter impacto nos movimentos das áreas urbanas. Falando especificamente sobre drones, a docente da FEUP lembrou que a utilização destes dispositivos já é uma realidade na monitorização das zonas costeiras, das florestas e será ainda maior no contributo que poderá prestar “à pequena logística urbana”.
Nesta matéria, a convidada chamou a atenção para o impacto que as entregas domiciliárias estão, hoje, a gerar no sistema de transportes das cidades. Na perspetiva de Sandra Melo, as empresas ao cobrarem o mesmo valor para as entregas em casa, daquele que cobram pela obtenção dos produtos em pontos de recolha, “não estão a pensar na sustentabilidade”. A consequência é que se prevê “um agravamento de 10 minutos em média nas deslocações casa-trabalho” até 2030. “É um problema invisível, mas que está a afetar o Porto e com tendência para crescer”, acrescentou.
Veja o vídeo da intervenção de Sandra Brito e Melo
31 de outubro de 2022